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Como a Unbabel permite a comunicação por pensamento

Em entrevista exclusiva ao AIoT Brasil no Web Summit, Vasco Pedro, CEO da empresa, detalhou como o Halo pode dar uma vida nova para pacientes de doenças como ELA

14/11/2023

Como a Unbabel permite a comunicação por pensamento
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Por Fabiana Macedo, de Lisboa

Imagine utilizar a inteligência artificial para se comunicar pelo pensamento.  Pois o que era ficção agora pode virar realidade.  Esse é o projeto de Vasco Pedro, CEO da empresa portuguesa Unbabel, que deu uma entrevista exclusiva para o AIoT Brasil durante o Web Summit 2023, que acontece esta semana em Lisboa.

A empresa, que é especializada em linguagem, criou o Halo, um produto inovador que pode possibilitar que as pessoas se comuniquem sem o uso da voz, gestos ou escrita. Apenas com o uso do cérebro. Com isso, portadores de doenças como ELA (esclerose lateral amiotrófica) possam deixar o isolamento causado pela doença e se comunicar,  o que pode beneficiar milhares de pessoas.

AIoT Brasil – Vi sua apresentação no Web Summit e é muito impressionante o seu trabalho.  Para começar, gostaria que você falasse da origem da Unbabel e sobre os objetivos da empresa.

Vasco Pedro – A Unbabel tem como missão tornar fácil para qualquer organização poder trabalhar em várias línguas. E o que é que isso quer dizer?  Nós temos uma plataforma de tradução que combina inteligência artificial com tradução humana. Nosso objetivo é que é que quando uma empresa entrar em um novo mercado (ela precisa ter o website, o marketing, as vendas e o serviço de apoio ao cliente em várias línguas diferentes), que isso seja um processo simples, fácil, escalável.  Começamos em 2013 e já temos 400 pessoas, com presença em vários países e forte crescimento.

AIoT Brasil – E agora vocês têm o Halo. Como é esse projeto

VP – O Project Halo,  que começou com a ideia, e ainda continua a ideia, de criar uma maneira de poder falar apenas com o pensamento.  Um dia, a nossa expectativa é que venha a criar uma maneira de aumentar o cérebro humano para além da capacidade atual, mas o que nós percebemos, à medida que desenvolvemos esta tecnologia, é que tinha aplicações imediatas para problemas muito reais,  de pessoas que estão, de  várias maneiras, sem capacidade de comunicação.  Uma delas é a dos pacientes de esclerose lateral amiotrófica.

AIoT Brasil – Isso já é uma realidade? Como isso funciona?

VP – Na versão atual, nós combinamos uma interface neuronal não invasiva com um Large Language Model.  E o que acontece é, usando o Telegram como exemplo, recebo uma mensagem, isso é lido, portanto, eu tenho um áudio, consigo ouvir a mensagem no meu headset. Depois o Large Language Model gera potenciais respostas  que eu consigo selecionar, dizer sim ou não.  Esta primeira versão permite a interação com o LLM. E estamos trabalhando em uma nova versão que já permite quase o equivalente a escrever.

AIoT Brasil – Então o usuário escolhe uma resposta pré-determinada? 

VP – Sim, que foi gerada naquele momento, através da persona da AI, que conhece bastante sobre o usuário,  portanto, sobre as suas preferências, sobre as suas famílias, e depois o que diz é, ok, aqui estão 3 ou 4 hipóteses,  de linhas de pensamento diferentes, e o usuário consegue navegar as opções.

Nós estamos a ler, no fundo, os sinais que são enviados para os músculos, portanto, mesmo que eles não cheguem lá, eles vão nos ler,  é importante a gente captar o sinal dos neurônios musculares no destino.  O nosso objetivo é depois passar para EEG (eletroencefalograma), portanto, em vez de estar a captar os sinais musculares,  estar a ler diretamente na origem do cérebro, mas de uma maneira não invasiva.  Neste momento ainda não é possível, porque a tecnologia de EEG ainda é muito ruidosa, por causa do nosso crânio.  Não se conseguiu ultrapassar essa parte

AIoT Brasil – Qual é o plano de expansão da Unbabel? Quando teremos essa tecnologia na América Latina?

VP – Não temos data prevista, nós neste momento ainda estamos a trabalhar com o primeiro paciente,  estamos agora a escalar para mais pacientes, até agora isto tem existido dentro da Unbabel,  e no âmbito do projeto do Center for Responsible AI, e o nosso objetivo no próximo ano é fazer um spin-off,  e ter uma empresa própria a explorar este produto, esta tecnologia.  É difícil prever a rapidez de expansão, mas sim, o nosso objetivo é que, eventualmente, em qualquer lado do mundo onde haja um paciente que tenha a necessidade de se comunicar, que o Halo possa ajudar.

AIoT Brasil – Pensando um pouco mais adiante, que outras inovações você imagina que serão possíveis,  considerando a inteligência artificial generativa e tudo o que ela está trazendo?

VP –1acho que estamos muito no início daquilo que vai ser possível.  Uma maneira de pensar a inteligência artificial é como uma prótese cognitiva, ou seja, algo que aumenta a capacidade cognitiva do ser humano.  E isso nota-se muito, por exemplo, em que quando temos alguém que passou 20 ou 30 anos a especializar-se num tópico, vai beneficiar ainda de modelos de inteligência cognitiva, mas se calhar menos do que alguém que não é ainda um expert.

Portanto, alguém que está a começar uma carreira agora, se calhar vai conseguir começar a carreira a um nível de expert,  porque é complementado com inteligência artificial.  Ou seja, um médico, se calhar em conjunto com capacidade de análise de AI generativa,  vai conseguir fazer diagnósticos tão bem como um médico com 20 anos de experiência que viu muito mais casos.  Eu acho que isso vai ser verdade para advogados, para marketing, para todas as profissões que dependem de conhecimento.  Para um mecânico, para um piloto de aviões, para qualquer outra profissão.

AIoT Brasil –  E quando a gente fala sobre os riscos, tem essa parte ética também que tem que ser regulamentada,  mas sobre os riscos da inteligência artificial ligada a toda essa possibilidade de expansão positiva,  a gente tem o outro lado também…

VP – Sem dúvida. Todas as tecnologias, quanto mais poderosa uma tecnologia, mais potencial para o positivo e para o negativo tem.  E no fundo depende de nós conseguirmos usar a tecnologia para o positivo.  A tecnologia, no geral, tem tido uma força democratizadora no mundo.  O que eu quero dizer com isso é que, tipicamente, a tecnologia permite fazer-nos algo que antes era preciso mais pessoas.  Nós no início precisávamos de uma tribo inteira para caçar. Agora vamos ao Uber Eats e pedimos uma comida e ela vem.  De repente, qualquer pessoa hoje em dia tem um nível de vida melhor do que um rei na época medieval.  Isso é uma tendência, mas também implica que a tecnologia de guerra cria uma destruição muito maior por um número muito menor de pessoas.  Eu acho que vai haver uma tendência, um caminho, um esforço para haver legislação.  Acho que é difícil porque é uma tecnologia que evolui muito rapidamente.  Mas, por outro lado, o fato de esta tecnologia não estar na mão apenas de governos,  vai também permitir que haja mais pessoas a pensarem de maneira positiva também.  Há muitas utilizações que nós nem sequer pensamos agora, que ainda estão a ser inventadas pelas pessoas por todo o mundo.

AIoT Brasil – Para finalizar, o AIoT é um veículo que fala sobre inteligência artificial principalmente para os brasileiros.  O que você gostaria de dizer em relação ao Brasil?

VP – Eu acho que o Brasil é um mercado incrível.  Tem uma população grande e tem um mercado com potencial enorme.  Mas acho que, do ponto de vista de linguagem, é um dos mercados que nós vemos que tem alguma dificuldade na internacionalização.  E que há uma oportunidade enorme de expansão.  Ou seja, eu acho que usando a Inteligência Artificial, usando ferramentas como a Unbabel, no mercado brasileiro, o Brasil conseguiria aumentar significativamente sua projeção do mundo.  Porque a qualidade do trabalho está lá. O Brasil tem coisas incríveis.  Só que, às vezes, é mais difícil de ver de fora, até por questões de linguagem.  Porque, do ponto de vista de conhecimento de línguas, quando se compara com o países nórdicos, o Brasil poderia estar mais à frente.  E acho que estas novas tecnologias vão permitir combater esse gap.  Portanto, acho que a Inteligência Artificial vai ser ainda mais útil para países que têm potencial enorme como o Brasil,  mas que ainda não se desenvolveram tanto como podiam ter desenvolvido.

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