Por redação AIoT Portugal

“Estamos vendo uma dramática tendência de erosão democrática em todo o mundo, e um dos primeiros alvos de um aspirante a homem forte é a imprensa. E a razão para isso é bastante óbvia: é mais fácil fazer o que se quer quando ninguém faz perguntas incômodas nem traz à tona coisas que se prefere manter em segredo para o público, para os cidadãos.” Foi com esse alerta que Arthur Gregg Sulzberger (foto), presidente da The New York Times Company e editor do jornal The New York Times, abriu sua apresentação de hoje no Web Summit Lisboa, o evento de tecnologia que se realiza até quinta-feira na capital portuguesa.

Na conversa com Katherine Marr, CEO da National Public Radio (NPR), AG Sulzberger – como costuma ser chamado – citou o Brasil e Jair Bolsonaro como exemplos de perseguição à imprensa, ao lado de Donald Trump, Viktor Orbán, da Hungria, e Narendra Modi, da Índia, entre outros. “Não se trata mais de prender jornalistas ou assassiná-los nas ruas por fazerem seu trabalho. Trata-se de aumentar sistematicamente a pressão para que se torne cada vez mais difícil e, particularmente, mais oneroso financeiramente fazer o trabalho do jornalismo independente que aspirantes a homens fortes consideram perigoso para sua capacidade de operar com total liberdade”, disse.

A pressão, segundo Sulzberger, é feita em etapas, a começar por espalhar sistematicamente a desconfiança no jornalismo e normalizar o assédio a jornalistas. Depois, o “aspirante a homem forte” usa os tribunais para aumentar a pressão financeira e, em seguida, instrumentaliza os poderes do governo para ameaçar e punir diretamente os veículos de mídia que não o apoiam.

“Depois disso, eles ampliam essa pressão ao incentivarem aliados ricos e poderosos a lançarem seus próprios ataques. Em lugares como o Brasil e a Índia, vimos empresários poderosos ligados ao governo entrando com dezenas de processos por difamação em várias jurisdições para dificultar o trabalho dessas organizações. E, por fim, não basta apenas destruir o ecossistema midiático existente, certo? O que esses líderes querem é construir um novo ecossistema midiático repleto de veículos abertamente leais ao partido no poder”, explicou.

Para mostrar que todas essas etapas de pressão vêm ocorrendo hoje nos Estados Unidos, Sulzberger citou várias investidas de Trump e de Elon Musk contra o NY Times e outros jornais e emissoras de rádio e TV, que incluíram cortes significativos na publicidade e bloqueio a financiamentos. Porém, apesar dos ataques, Sulzberger afirmou que mantém sua confiança no jornalismo independente.

“Acho que o primeiro passo é simplesmente não se deixar abalar. Nosso trabalho se torna mais difícil quando se enfrenta esse tipo de pressão, e as fontes se afastam. Há um clima tenso no ar. As consequências são graves. Mas seus direitos só se mantêm se você lutar por eles, certo? E é isso que nós estamos fazendo. E não podemos ser induzidos a nos tornarmos a oposição. A independência está no cerne da nossa missão jornalística, e temos muito orgulho de termos produzido o maior conjunto de jornalismo investigativo já feito por uma única organização de notícias sobre um único assunto: Donald Trump. Mas continuaremos a escrever sobre seus sucessos, certamente”, disse.

De acordo com Sulzberger, o mais importante é trabalhar arduamente para explicar a todos que o jornalismo sério é importante para manter saudável a democracia. “Sim, conhecimento é poder, certo? E é muito caro e, infelizmente, muitas vezes aqueles que o praticam ou aqueles que enfrentam os maiores prejuízos para defendê-lo são os que mais sofrem”, acrescentou.